20 de jul. de 2011

Uma experiência única

Sempre penso em escrever um pouco sobre minha experiência em Plum Village, na França, mas nunca sei direito o que eu posso compartilhar ou por onde começo mesmo. Para quem não disse ainda, eu vivi quatro meses em um monastério zen budista, chamado Plum Village, no Sul da França. Isso no ano passado. Antes de ir, havia frequentado algumas vezes uma sangha (grupo ou comunidade) nesta linha de meditação, do mestre vietnamita Thich Nhat Hanh, mas nunca tinha pensado que iria de fato para lá, numa imersão tão grande. Aliás, são dessas coisas que a vida te empurra e te leva a viver, quase como algo planejado por ela. Enfim, nessa época achava impossível meditar, minha cabeça não parava de produzir pensamentos (não que isso não aconteça hoje... mas percebo muitas mudanças neste processo). Por mais que eu tivesse uma boa intenção, tinha sempre algo que era mais importante, algum compromisso ou saída com amigos.

Foi preciso a vida me parar, sem emprego, sem dinheiro para que eu pudesse ver que era preciso crescer nesse caminho da auto-descoberta e navegar mais intensamente pelo meu mundo interno. Isso foi há um ano. Eu tinha ido para Minas passar uma temporada no interior, na casa da minha tia. Na verdade, era uma estadia breve, só enquanto esperava a resposta de uma audição para uma cia de teatro. Fato é que eu não passei. E aquilo me surpreendeu tanto e me arrasou. Ficava repassando na cabeça o que eu tinha feito de errado ou porque não tinha percebido que não daria certo, tamanha era minha certeza de que passaria na seleção para a vaga. Só que a vida me parou, como eu disse mais acima. E eu estava no interior do interior, tendo que rever minhas ideias sobre a minha vida. E isso foi muito difícil.

Costumo lembrar com tanto carinho desse um mês na casa da minha tia que fico até boba, porque, no meio de tanta maravilha que foi surgindo, veio muita dor também. Parece a flor de lótus que surge da lama (não discriminando nossos sofrimentos, pois minha experiência me prova que eles sempre estão a favor do nosso crescimento, nos colocando à diante). Eu sei que fiquei dias tentando entender tudo aquilo. Quase que olhando para a parede tentando encontrar a razão, o motivo, para a vida ter me levado até ali e me colocado numa situação de suspensão, que para mim era tão desconfortável. Não saber o que se passava, o que ia fazer... E a gente ainda acha que controla a vida.

Foi num dos dias desse um mês que eu entendi tudo, quase como mágica. Nunca imaginei viver algo assim, mas a verdade é que numa tentativa desesperadora eu resolvi fazer uma oração, coisa que não era uma prática minha. Até hoje, entendo a oração como uma meditação e vice-versa. Naquela noite, eu pedi, como nunca havia feito antes, para ter a capacidade de ver o que havia me levado até aquela situação. O que eu precisa aprender? Lembro de ter apertado as mãos e os olhos e buscando bem no fundo, com uma simples pergunta: O que eu preciso ver?

A resposta veio. E foi inacreditável. Aconteceu o que entendi como meu primeiro insight. Em 30 segundos, eu vi muitas coisas na minha vida, coisas do passado, em flash. Como boa pensadora (por hábito e não necessariamente por qualidade filosófica), eu não reconheci aquele mecanismo. Não era a estrutura de um pensamento, era algo novo para mim. Um acesso a uma consciência que se revela na medida certa, me orientando sobre o que me levava ali e o que era preciso fazer. Não ouvi voz e depois simplesmente sabia tudo o que devia fazer. Sabia que meu foco e ao que mais deveria me dedicar eram dois temas: perdão e reconciliação. E sabia quem eram os envolvidos. Fiquei muito surpresa, aliviada por ter estabelecido uma comunicação interna. Junto com os temas, me veio a palavra Plum Village. Eram muitos acontecimentos numa única noite, fui dormir.

No dia seguinte, ao abrir as portas do quarto que davam para um grande jardim, me deparei com um brilho forte vindo das plantas, do céu, de tudo. Era tão lindo, cada brisa, tudo ali, existindo. Fiquei um bom tempo com minhas percepções aguçadas, vivendo um prazer pelo momento presente, até então inexplicável e muito novo. Hoje boa parte dele se foi. Não sei qual é a explicação, sinto saudade de quando via o mundo com os olhos da primeira vez, apesar de ver aquelas paisagens desde da infância. Mas parecia novo. E era muito intenso.

Lembro que abri minha caixa de emails no dia seguinte e lá estava uma mensagem de.... retiro em Plum Village. Havia recebido uma newsletter da sangha, avisando sobre o encontro na França. Po, mas na França? Eu não tinha mais de 100 reais na minha conta bancária. Pois é, eu decidi escrever para lá. E, quando vi, já tinha mandado o email e em português! Qual a probabilidade de monges no sul da França te responderem em português? No meu caso, 100%, graças a um único monge, de Portugal, no meio de 300 outros do Vietnã, Europa, EUA... Ele me respondeu e me deu todo o apoio. Apliquei para uma bolsa de residente, vendi meu móveis (guardados fazia tempo na casa do meu pai) e fui!

Foi assim que começou minha aventura.

Depois volto para contar os próximos capítulos!

Namaste.