18 de nov. de 2011

A dança da alma

Eu já vi algumas vezes este vídeo (abaixo), com essa criança linda, foférrima e talentosa, que canta com o pai. E sempre me bate a mesma ideia, as mesmas ideias. São muitas, porque é muito intenso ver toda essa naturalidade, essa autenticidade, que vive em cada um de nós, desde bem pequenos, e que, de alguma forma, muitas vezes, fica escondida lá no fundo, quase esquecida.

É, a gente é assim. Nossa, dá até para esquecer. Esquecer que a gente pode rir de verdade e não fingir que está rindo para compor uma cena, agradar alguém ou ficar bem na foto. Rir, brincar, gritar, cantar, dançar, como se fosse o único momento, o momento único - este aqui e agora que pega e me arrebata de vez.

Eu sinto nesse vídeo que ela está ali mesmo, sem pensar no que deveria ter feito ou tem que fazer, sem se preocupar se está desafinando ou poderia cantar melhor. A expressão dela é o que é, simplesmente autoral e natural (a rima é contagiante, rs). Como todo o Ser vibra com esses momentos, a perfeita e justa expressão de cada um.

Que a gente possa estar atento às nossas verdades corporais, sentimentais e em todos os gestos, palavras e sentidos. Que a gente possa viver tão intensamente o nosso pulsar que todo nosso corpo vibre junto, num devir alucinante, alucinógeno, cheio de magia e pura alegria inebriante. Ai, a dança da alma.... ela está sempre por vir. E sempre presente. Namaste. 

17 de nov. de 2011

As árvores pelo caminho

Ando bastante pelo Rio. De um ano para cá, um dos meus maiores prazeres é flanar por aí, sem destino. Logo num dos primeiros percursos aleatórios que fiz, dei de cara com a Lagoa Rodrigo de Freitas e fiquei boba. Nossa, como é lindo tudo isso. Depois fui me colocando alguns desafios pela frente, nada a ver com contagem de kms ou coisa assim. Mas comecei a ter vontade de simplesmente sair mais cedo de casa (digo, antes do compromisso para onde iria) e chegar até o lugar marcado com meus próprios pés, por mim mesma. Gente, é muito legal essa brincadeira, porque isso foi me dando um sensação de liberdade, independência e tudo numa curtição do percurso. Uns mais complexos, tipo atravessar toda a Voluntários da Pátria, numa certa velocidade (ainda sem correr) e não esbarrar nas pessoas (as calçadas de Botafogo são muito estreitas!) e outros mais discretos, pequenas tarefas do cotidiano.

Depois de um tempo de experimento andarilho, aceitei um convite para trabalhar no Centro do Rio, daí acabei sucumbindo ao ônibus - já sei... seria uma boa chance de testar minha liberdade por alguns kms a mais... Pois é, eu fraquejei, rs. Coisa boa ou não, foi assim que eu descobri outro enquadramento para o meu olhar. Pela janela do ônibus, eu me encanto a cada dia com aquela Enseada de Botafogo, seus morros e... as árvores. Pronto, cheguei nas lindas e maravilhosas, majestosas árvores.

Nossa, é de arrepiar como elas se expressam, se manifestam com tamanha sabedoria e beleza. Eu fico tão apaixonada por elas que, às vezes, parece que elas falam. Por exemplo, logo quando você entra na Enseada de Botafogo, depois do mergulhão que sai de Copacabana e entra na descida do viaduto, você olha para direita, que (ainda antes de descer) você vai ver uma baita árvore, lindíssima, com aquele prédio empresarial ao fundo. Nossa, para mim, é como se ela usasse dreadlocks - aqueles galhos gordos, cheios de folhas, puxam na minha memória os conhecidos e famosos cachos estilosos do mundo rastafari. Acho engraçado porque ela se impõe ao olhar com uma presença que marca a retina. Quando chove muito, eu me pergunto como ela vai dar conta de tanta água e não se embebedar com ela, escoar tudo.

Adiante, pela Enseada e depois pelo Aterro, as árvores se revezam na disputa pelo primeiro plano, segundo, terceiro, até o infinito. Um espetáculo, evoé, que chama meu olhar todos os dias e ensina que, mesmo, não há discriminação. Uma aula de como não há comparação, o mais belo, o mais feio, as dualidades ou os velhos pares de opostos. Elas simplesmente carregam, cada uma em si, a beleza da criação, sem diferenças. Evoé, mais uma vez!



14 de nov. de 2011

Para saudar as senhoras das águas

Oxum e Iemanjá, as rainhas da água doce e do mar, respectivamente, que possamos sempre agradecer tantas alegrias, carinhos e energias de mãe. Que vocês estejam sempre presentes dentro e fora de cada um de nós.
Vamos mantrar por vocês...

Este em iourubá, cantando para Iemanjá...

E a louvação para Oxum, pela voz de Maria Bethania:



27 de out. de 2011

Investigações do dia: um polimento nas lentes do olhar

Desde pequena, aprendi que as perguntas são quase vilãs da história, uma coisa que devíamos evitar em excesso. Com isso, fiquei meio confusa ao longo dos anos, porque quanto mais eu crescia mais perguntas surgiam sobre o mundo, sobre mim e os outros. Volta e meia, quando elas saíam pela minha boca, alguém me dizia: pára de perguntar, menina... vc é muito "perguntadeira"! Pois é, eu cresci com certo conflito interno, porque as perguntas não deixavam de se formar dentro, talvez não ganhassem tanta expressão fora - na faculdade, então, me lembro de ser super tímida com as perguntas. Me dava até frio na barriga de pensar em soltar uma delas. Depois fui trabalhar e, claro, arranjei uma profissão que incluísse as minhas perguntas que brotavam como nunca. Jornalista pode perguntar, né... espera-se que ele faça isso. Então, foi um bom casamento, em certo ponto, como início de partida. Com o tempo, foi dando aquela vontade de fazer outras perguntas, perguntas para mim mesma, perguntas para nada ou para alguém. Perguntas. Confesso que carregava em mim ainda aquela sensação de estar perdendo tempo com perguntas, lá no fundo, sabe. Aquela aflição por estar perguntando. Foi aí que eu conheci uma amiga perguntadeira de nascença, que me mostrou a poética da arte de perguntar.

O que eu vi? As perguntas são inspiradoras, quando são boas perguntas, aquelas que buscam mais estar do que ser e menos ainda ter. Sem resposta, jogadas no espaço que nutre, dá fluxo, encantam a alma. Parece que apertaram um botão aqui dentro, porque elas agora jorram da minha boca, sem culpa, e com alegria, sentindo todo êxtase que se tem quando a expressão se dá e se espalha pelo mundo.

Para não perder o costume, algumas investigações do dia:

Como eu movo a escuta em mim?

Como é falar para mim?

Como eu me vejo?

Como é ser vista por mim?

Eu me escuto e não "o outro me escuta". Eu me vejo e não "o outro me vê".

Um ajuste de foco, um polimento nas lentes do olhar.

26 de out. de 2011

O meu jardim

O quintal da minha casa é o mundo. Nele, eu plantei um jardim com margaridas, lírios, pitangeiras, uma jaboticabeira e muitos girassóis, rodeados de cerejeiras. As borboletas pousam de flor em flor, um riacho corre, o ar é tão puro e venta os cabelos, as pétalas das rosas, as copas das árvores, anciãs da terra que tudo brota.

No meu jardim, acontece de às vezes surgir bicho de goiabeira, praga de comer verde e até resto de coisa esquecida, mas eu logo levo água, deixo bastante sol entrar, ar fresco bater e lá está de novo ele, verdejante, sorridente, florindo por aí afora.

Onde o cuidado se dá

Cuidar. Recentemente, tive uma experiência única de estar na troca com alguém, que me revelou um lugar conhecido de berço. Posso dizer que hoje a clareza habitou melhor em mim, e eu pude olhar para este cuidado que este alguém me ofereceu de uma nova forma, com mais profundidade, eu acho. Sabe aquele lugar em que vc fala, e o outro não te escuta? Parece que o roteiro do encontro já estava escrito, e você só entrou nele para participar desta configuração já montada e definida. Esta foi a sensação neste encontro com este alguém. A pessoa fazia coisas, falava coisas, e nada que eu falasse ou que eu sentisse parecia chegar do lado de lá, no outro.

Uma sensação de impotência me veio no corpo, quando a outra pessoa revelou-se em outros tons. Veio, neste momento, sua caraterística certeira de ações e opiniões, era a onda de imposição que atravessava aquele encontro. Foi estranho estar ali, de novo, agora adulta. Estar ali sem ser ouvida e receber tantas informações e direcionamentos. A imposição é uma coisa.

Depois do encontro, fiquei reverberando aquilo de um jeito que, sei lá, não sabia se era irritação, pena, aceitação. Sabia que tinha me afetado bastante. Ainda não tenho respostas. Mas surgiram perguntas, boas perguntas como diz uma amiga: Como é estar em contato com este cuidado que impõe, onde não há escuta, troca de amor? O que move em mim neste encontro? Como é mover em mim este cuidado imposto? Porque uma coisa eu vi, é um cuidado, imposto sim, sem troca sim, mas quem oferece, por incrível que pareça, coloca-se no lugar de mover o cuidado que é possível nela e oferecer os frutos desta investigação ao outro. No caso, a mim. Ai, gente... muita coisa. Espero que a gente possa mover estes mundos internos cada vez mais.

Namaste.

A frase do dia

"Quietude e entrega, sem controle algum, vão abrir as portas da visão."

18 de ago. de 2011

Para você, sempre

Hoje quero dedicar meu dia ao meu espírito. Levá-lo para passear de ônibus, passar pelo Aterro e pela Lapa, entrar na redação de um jornal. E escrever.

Todas as vezes que eu me sentir menor, envolvida com problemas da pele, eu vou lembrar que o dia é dele e que eu sou um ser cósmico.


20 de jul. de 2011

Uma experiência única

Sempre penso em escrever um pouco sobre minha experiência em Plum Village, na França, mas nunca sei direito o que eu posso compartilhar ou por onde começo mesmo. Para quem não disse ainda, eu vivi quatro meses em um monastério zen budista, chamado Plum Village, no Sul da França. Isso no ano passado. Antes de ir, havia frequentado algumas vezes uma sangha (grupo ou comunidade) nesta linha de meditação, do mestre vietnamita Thich Nhat Hanh, mas nunca tinha pensado que iria de fato para lá, numa imersão tão grande. Aliás, são dessas coisas que a vida te empurra e te leva a viver, quase como algo planejado por ela. Enfim, nessa época achava impossível meditar, minha cabeça não parava de produzir pensamentos (não que isso não aconteça hoje... mas percebo muitas mudanças neste processo). Por mais que eu tivesse uma boa intenção, tinha sempre algo que era mais importante, algum compromisso ou saída com amigos.

Foi preciso a vida me parar, sem emprego, sem dinheiro para que eu pudesse ver que era preciso crescer nesse caminho da auto-descoberta e navegar mais intensamente pelo meu mundo interno. Isso foi há um ano. Eu tinha ido para Minas passar uma temporada no interior, na casa da minha tia. Na verdade, era uma estadia breve, só enquanto esperava a resposta de uma audição para uma cia de teatro. Fato é que eu não passei. E aquilo me surpreendeu tanto e me arrasou. Ficava repassando na cabeça o que eu tinha feito de errado ou porque não tinha percebido que não daria certo, tamanha era minha certeza de que passaria na seleção para a vaga. Só que a vida me parou, como eu disse mais acima. E eu estava no interior do interior, tendo que rever minhas ideias sobre a minha vida. E isso foi muito difícil.

Costumo lembrar com tanto carinho desse um mês na casa da minha tia que fico até boba, porque, no meio de tanta maravilha que foi surgindo, veio muita dor também. Parece a flor de lótus que surge da lama (não discriminando nossos sofrimentos, pois minha experiência me prova que eles sempre estão a favor do nosso crescimento, nos colocando à diante). Eu sei que fiquei dias tentando entender tudo aquilo. Quase que olhando para a parede tentando encontrar a razão, o motivo, para a vida ter me levado até ali e me colocado numa situação de suspensão, que para mim era tão desconfortável. Não saber o que se passava, o que ia fazer... E a gente ainda acha que controla a vida.

Foi num dos dias desse um mês que eu entendi tudo, quase como mágica. Nunca imaginei viver algo assim, mas a verdade é que numa tentativa desesperadora eu resolvi fazer uma oração, coisa que não era uma prática minha. Até hoje, entendo a oração como uma meditação e vice-versa. Naquela noite, eu pedi, como nunca havia feito antes, para ter a capacidade de ver o que havia me levado até aquela situação. O que eu precisa aprender? Lembro de ter apertado as mãos e os olhos e buscando bem no fundo, com uma simples pergunta: O que eu preciso ver?

A resposta veio. E foi inacreditável. Aconteceu o que entendi como meu primeiro insight. Em 30 segundos, eu vi muitas coisas na minha vida, coisas do passado, em flash. Como boa pensadora (por hábito e não necessariamente por qualidade filosófica), eu não reconheci aquele mecanismo. Não era a estrutura de um pensamento, era algo novo para mim. Um acesso a uma consciência que se revela na medida certa, me orientando sobre o que me levava ali e o que era preciso fazer. Não ouvi voz e depois simplesmente sabia tudo o que devia fazer. Sabia que meu foco e ao que mais deveria me dedicar eram dois temas: perdão e reconciliação. E sabia quem eram os envolvidos. Fiquei muito surpresa, aliviada por ter estabelecido uma comunicação interna. Junto com os temas, me veio a palavra Plum Village. Eram muitos acontecimentos numa única noite, fui dormir.

No dia seguinte, ao abrir as portas do quarto que davam para um grande jardim, me deparei com um brilho forte vindo das plantas, do céu, de tudo. Era tão lindo, cada brisa, tudo ali, existindo. Fiquei um bom tempo com minhas percepções aguçadas, vivendo um prazer pelo momento presente, até então inexplicável e muito novo. Hoje boa parte dele se foi. Não sei qual é a explicação, sinto saudade de quando via o mundo com os olhos da primeira vez, apesar de ver aquelas paisagens desde da infância. Mas parecia novo. E era muito intenso.

Lembro que abri minha caixa de emails no dia seguinte e lá estava uma mensagem de.... retiro em Plum Village. Havia recebido uma newsletter da sangha, avisando sobre o encontro na França. Po, mas na França? Eu não tinha mais de 100 reais na minha conta bancária. Pois é, eu decidi escrever para lá. E, quando vi, já tinha mandado o email e em português! Qual a probabilidade de monges no sul da França te responderem em português? No meu caso, 100%, graças a um único monge, de Portugal, no meio de 300 outros do Vietnã, Europa, EUA... Ele me respondeu e me deu todo o apoio. Apliquei para uma bolsa de residente, vendi meu móveis (guardados fazia tempo na casa do meu pai) e fui!

Foi assim que começou minha aventura.

Depois volto para contar os próximos capítulos!

Namaste.

15 de mar. de 2011

Os oito versos que transformam a mente

1. Com a determinação de alcançar
o bem supremo em benefício de todos os seres sencientes,
mais preciosos do que uma jóia mágica que realiza desejos,
vou aprender a prezá-los e estimá-los no mais alto grau.

2. Sempre que estiver na companhia de outras pessoas, vou aprender
a pensar em minha pessoa como a mais insignificante dentre elas,
e, com todo respeito, considerá-las supremas,
do fundo do meu coração.

3. Em todos os meus atos, vou aprender a examinar a minha mente
e, sempre que surgir uma emoção negativa,
pondo em risco a mim mesmo e aos outros,
vou, com firmeza, enfrentá-la e evitá-la.

4. Vou prezar os seres que têm natureza perversa
e aqueles sobre os quais pesam fortes negatividades e sofrimentos,
como se eu tivesse encontrado um tesouro precioso,
muito difícil de achar.

5. Quando os outros, por inveja, maltratarem a minha pessoa,
ou a insultarem e caluniarem,
vou aprender a aceitar a derrota,
e a eles oferecer a vitória.

6. Quando alguém a quem ajudei com grande esperança
magoar ou ferir a minha pessoa, mesmo sem motivo,
vou aprender a ver essa outra pessoa
como um excelente guia espiritual.

7. Em suma, vou aprender a oferecer a todos, sem exceção,
toda a ajuda e felicidade, por meios diretos e indiretos,
e a tomar sobre mim, em sigilo,
todos os males e sofrimentos daqueles que foram minhas mães.

8. Vou aprender a manter estas práticas
isentas das máculas das oito preocupações mundanas,
e, ao compreender todos os fenômenos como ilusórios,
serei libertado da escravidão do apego.

As oito preocupações mundanas são:

1. Desejar elogios
2. Rejeitar críticas
3. Desejar o prazer
4. Rejeitar a dor
5. Desejar o ganho
6. Rejeitar a perda
7. Desejar a fama
8. Rejeitar ser ignorado

Esse texto foi ensinado por S.S. o Dalai Lama, no Brasil, em abril de 2006, no templo Zu Lai, em Cotia (SP).

8 de mar. de 2011

Amo-te















"Ao dizerdes a alguém 'amo-te', ou o dizes indiferentemente, sem sinceridade - ou o dizes com intensidade, com ardor; e se a outra pessoa se mostra indiferente, não há então comunhão entre ambos. Só é possível a comunhão quando ambas as partes se mostram igualmente 'intensas', e não indiferentes ou reservadas. Quando um e outro dão generosamente, isso produz uma extraordinária 'intensidade'; já não há 'um que dá e outro que recebe'."

A libertação dos condicionamentos, de J. Krishnamurti (Ed. I.C.K.) 

Um mundo novo















"Só quando livre, realmente livre, uma pessoa é capaz de aprender; ela é, então, ao mesmo tempo instrutor e discípulo. (...) Isso só se torna possível quando se percebe a importância de vermos, de observarmos, por nós mesmos, as coisas tais como são. Em geral, estamos pouco cientes de nosso interior. Não sei se já observastes as pessoas que estão sempre a falar de si; da posição que a si próprias atribuem na vida: 'Eu, em primeiro lugar; tudo o mais é secundário'. Para que possa haver cooperação, comunhão e comunicação entre nós, é claro que tem de desaparecer essa barreira - 'Primeiro eu, e tudo mais é secundário'. O 'eu' assume desmedida importância e se manifesta de inúmeras maneiras. Eis porque se tornam perigosas as organizações, embora tenhamos necessidade de organização. Os que se acham à testa de uma organização ou empunham o poder da organização se tornam gradualmente a fonte da 'autoridade'. E com tais pessoas é impossível cooperar, comungar."

"Nós temos de criar um mundo novo. Isto não são meras palavras, uma mera idéia: temos realmente de criar um mundo totalmente diferente, onde, como entes humanos, não vivamos a batalhar uns contra os outros e a entredestruir-nos; onde um indivíduo não domine outro com suas idéias ou seu saber; onde cada ente humano seja realmente, e não teoricamente, livre. Porque só nessa liberdade se pode estabelecer a ordem no mundo. Vamos, pois, se possível, desembaraçar-nos da rede que tecemos em redor de nós mesmos, a qual impede a cooperação, a qual nos separa e cria tanta ansiedade, e tristeza, e isolamento."

A libertação dos condicionamentos, de J. Krishnamurti (Ed. I.C.K.)  


26 de fev. de 2011

Conselho zen

Me lembrei daquela história zen, em que o discípulo pergunta para o mestre:

- "Mestre, como o senhor põe a iluminação em ação? Como pratica na vida de todo o dia?"
- "Comendo e dormindo", responde o mestre.
- "Mas, Mestre, todo mundo come e todo mundo dorme."
- "Mas nem todos comem quando comem e nem todos dormem quando dormem."

Daí vem a famosa citação zen: "quando como, como; quando durmo, durmo."

21 de fev. de 2011

Meditar durante a irritação

"Quando surge a irritação, a meditação andando pode ser de grande ajuda. Tente recitar este verso enquanto anda:

Inspirando, eu sei que a irritação está em mim.
Expirando, eu sei que este sentimento é desagradável.
(Depois de algum tempo): Inspirando, estou calmo.
Expirando, agora estou bastante forte para controlar esse sentimento.


 "Até conseguir a calma suficiente para encarar de frente a irritação, continue desfrutando simplesmente de sua respiração, de seu caminhar e das belezas ao ar livre. Depois de algum tempo a irritação vai diminuir e você estará forte o bastante para encará-la de frente, para entender suas causas e para começar o trabalho de transformá-la."

Thich Nhat Hanh, em Meditação andando - guia para paz interior (Editora Vozes).



5 de fev. de 2011

Olhar para dentro

"A diferença que essa leve mudança de orientação pode fazer é enorme, e pode até reverter aqueles desastres que ameaçam o mundo. Quando um número muito maior de pessoas conhecer a natureza de sua mente, conhecerá também a gloriosa natureza do mundo em que vive e lutará com urgência e coragem para preservá-lo. É interessante que a palavra para 'budista' em tibetano é nangpa, significando 'pessoa do lado de dentro': aquele que busca a verdade não no exterior, mas dentro da natureza da mente. Todos os ensinamentos e treinamentos no budismo são dirigidos para esse único ponto: olhar para dentro da natureza da mente, libertando-nos assim do medo da morte e ajudando-nos a compreender a verdade da vida.

"Olhar para o interior exige de nós grande sutileza e coragem - nada menos que uma mudança completa em nossa atitude em relação à vida e à mente. Estamos de tal modo viciados em olhar para fora de nós mesmos, que perdemos quase por completo o acesso ao nosso interior. Ficamos apavorados com a ideia de olhar para dentro, porque nossa cultura não nos dá a mais vaga ideia do que encontraremos. Podemos até pensar que se o fizermos correremos o risco de enlouquecer. Esse é um dos últimos e mais engenhosos estratagemas do ego para evitar que descubramos nossa verdadeira natureza.

"Assim, tornamos nossas vidas tão febris, que eliminamos delas o mais ligeiro risco de olhar para dentro de nós. Mesmo a ideia de meditação pode assustar as pessoas. Quando ouvem falar nas palavras 'ausência de ego' ou 'vacuidade', elas pensam que experimentar esses estados equivaleria a ser lançado da escotilha de uma nave espacial para flutuar para sempre no vazio escuro e gelado do espaço. Nada poderia estar mais distante da realidade. Mas num mundo dedicado à distração, o silêncio e a quietude nos aterrorizam. Protegemo-nos deles com o barulho e a atividade frenética. Observar a natureza da nossa mente é a última coisa que ousaríamos fazer.

"Às vezes, penso que não queremos fazer perguntas verdadeiras para saber quem somos, por medo de descobrir que existe uma outra realidade diferente desta. O que essa descoberta faria da maneira como vivemos até agora? Como nossos amigos e colegas reagiriam ao que agora sabemos? Que faríamos com esse novo saber? Com o conhecimento vem a responsabilidade. Às vezes, mesmo quando a porta da cela se escancara, o prisioneiro prefere não sair."   

Sogyal Rinpoche, em O livro tibetano do viver e do morrer (Editora Talento/Palas Athena).

A natureza profunda da mente

"Palavra alguma pode descrevê-la
Exemplo algum pode indicá-la
O samsara não pode fazê-la pior
O nirvana não pode fazê-la melhor
Ela jamais nasceu
Ela jamais acabou
Ela jamais foi liberada
Ela jamais se enganou
Ela jamais existiu
Ela jamais inexistiu
Ela não tem limite algum
E não pode ser contida em categorias."

Dudjom Rinpoche

30 de jan. de 2011

Autobiografia em Cinco Capítulos

(1) Ando pela rua
Há um buraco fundo na calçada
Eu caio
Estou perdido... sem esperança.
Não é culpa minha.
Leva uma eternidade para encontrar a saída.

2) Ando pela mesma rua.
Há um buraco fundo na calçada
Mas finjo não vê-lo.
Caio nele de novo.
Não posso acreditar que estou no mesmo lugar.
Mas não é culpa minha.
Ainda assim leva um tempão para sair.

3) Ando pela mesma rua.
Há um buraco fundo na calçada
Vejo que ele ali está
Ainda assim caio... é um hábito.
Meus olhos se abrem
Sei onde estou
É minha culpa
Saio imediatamente.

4) Ando pela mesma rua.
Há um buraco fundo na calçada
Dou a volta.

5) Ando por outra rua.

Portia Nelson, citado por Charles L. Whitfield, M.D., em Healing the Child Within (Orlando, Flórida: Health Communications, 1989).

28 de jan. de 2011

Por uma terra saudável


















Cuidar melhor do mundo em que a gente vive, de nós mesmos, é ampliar nossa consciência. Saber que cada escolha que faço influi no todo e que sou potente para criar a realidade que escolho; praticar o consumo consciente, pensando no que se compra, de onde vem, como é fabricado. A gente sabe que a maioria dos produtos disponíveis nas prateleiras dos supermercados produz sofrimento à natureza, destrói nossas florestas, polui o ar e os rios e gera sofrimento a muitos outros seres humanos, com condições péssimas de trabalho.

Quando compro um produto, compro também tudo o que ele gerou, assino embaixo, financio a rede que se montou, completando um ciclo. Se uma empresa usa mão-de-obra infantil ou impõe rotinas sofríveis de trabalho, estou dando meu voto para isso também. A decisão de comprar algo é um grande poder que as pessoas têm, o poder do consumo.
Queremos ser um povo que escolhe sua expressão no mundo. E o caminho é doação, é cuidado. O chamado é ver o que realmente colocamos dentro de casa, nas nossas mesas: Que empresas são essas? Como trabalham? O que vendem na realidade? Perpetuam a miséria com seu negócio?
De que adianta limpar a casa, se, com esses mesmos produtos de limpeza, contribuímos para a poluição do planeta? O que está limpo?  

Dois mestres falam sobre o assunto:
“Nossa Terra, nossa linda e verde Terra, está em perigo e todos sabemos. Ainda assim, agimos como se nossas vidas diárias não tivessem nada a ver com a situação do mundo. Se a Terra fosse o nosso corpo, você seria capaz de sentir muitas áreas onde ela está sofrendo.
Muitas pessoas estão conscientes do sofrimento do mundo e seus corações estão cheios de compaixão. Elas sabem o que precisa ser feito e engajam-se no trabalho político, social e ambiental para tentar mudar as coisas.
Mas, depois de um período de intenso envolvimento, elas ficam desencorajadas, porque falta a elas a força necessária para sustentar uma vida de ação. A força real não está no poder, dinheiro ou armas, mas em uma profunda paz interior.”
Thich Nhat Hanh
“No mundo altamente interdependente de hoje, indivíduos e nações já não podem mais resolver muitos de seus problemas sozinhos. Precisamos uns dos outros. Devemos por isso desenvolver um sentido de responsabilidade universal... É nossa responsabilidade coletiva e individual proteger e alimentar a família global, amparando seus membros mais fracos, preservando e cuidando do meio ambiente em que todos vivemos.”
Dalai Lama

25 de jan. de 2011

Lembrete para carregar no bolso


"Reconheça sempre que a qualidade da vida é como a de um sonho e reduza o apego e a aversão. Pratique a boa vontade com todos os seres. Seja amoroso e compassivo, não importa o que os outros lhe façam. O que eles farão não tem tanta importância quando você vê tudo como um sonho. A arte é manter intenção positiva durante o sonho. Esse é o ponto essencial. Essa é a verdadeira espiritualidade."

Chagdud Tulku Rinpoche, Life in Relation to death (Cottage Grove, OR: Padma Publishing, 1987), 28.  

24 de jan. de 2011

De volta para o presente


É tão fácil se ausentar de si mesmo. O grande desafio é estar presente. E é a postura mais revolucionária que o ser humano pode assumir nos dias de hoje. No aqui e agora, estar simplesmente. Ser consciente do meu corpo, da mente e dos mecanismos internos, emoções, que flutuam rapidamente, como um oceano cheio de ondas. Não sou as ondas. Não posso me esquecer da minha natureza água. As ondas passam, mesmo que pareçam enormes naquele momento. 

Vendo o mundo que a gente criou, abundante em som e imagem, o desafio é estar atenta aos movimentos no meu corpo e na minha mente, enquanto atravesso a Avenida Rio Branco, na hora do almoço, ou me esforço para entrar no carro do metrô, no final do dia. São nesses momentos que afirmo e fortaleço a minha criação, de estar consciente. E como? 

A prática pode ser variada. Atualmente, escolhi a respiração como objeto da minha atenção, mas, quando sinto dificuldades em me concentrar assim, busco o que for mais fácil no momento. Voltando ao exemplo da Av. Rio Branco, se eu sinto que não consigo observar a respiração enquanto atravesso, posso escolher observar meus pés pisando o chão ou como minha cabeça balança enquanto me movimento em direção ao outro lado. São pequenas tarefas que me coloco e me trazem para o momento presente.     

E qual a importância disso? Estar presente faz com que eu seja autora da minha vida. Viver no agora é me ver a cada instante e escolher plenamente, experimentar a liberdade; poder oferecer minha presença para aqueles que eu amo, para o mundo, para a vida. Um ciclo que se completa, eu que recebo tanto da vida – alimento, abrigo, chão, sustentação – ofereço de volta minha criação, minha presença, num casamento perfeito.